análise das transferências especiais direcionadas ao Estado do Piauí em 2023.
Resumo
– Em 2023, emendas parlamentares individuais impositivas ao Orçamento-Geral da União, da ordem de R$ 236,8 milhões (98%), na modalidade transferências especiais, foram direcionadas ao Piauí.
– Apenas 2% das emendas individuais (R$ 4,9 milhões) dependeram de convênios (transferências com finalide definida).
– Municípios com baixa população, a exemplo de Buriti dos Lopes (19.654 habitantes), Pimenteiras (11.341 habitantes), e Caridade do Piauí (5.033 habitantes), foram os que receberam os maiores aportes, entre R$ 9,0 e R$ 11,0 milhões.
– Em termos per capita, Floresta do Piauí (2.333 habitantes) foi contemplada com R$ 3.236,18, enquanto Teresina (868.075 habitantes), foi contemplada com R$ 2,02.
Emendas Parlamentares
A Constituição Federal de 1988, em seu § 9º, do art. 166, estatui acerca da participação dos parlamentares nas emendas individuais ao projeto de lei orçamentária anual – PLOA, da União.
Segundo as regras estipuladas pela Emenda Constitucional 126/2022 – EC 126/2022, o cálculo para a definição do valor da emenda individual leva em consideração a Receita Corrente Líquida – RCL do ano anterior ao PLOA. Deputados Federais têm direito a 1,55% da RCL, enquanto Senadores, a 0,45% da RCL.
Trocando em números, no orçamento anual do exercício de 2024, cada Deputado Federal teve direito a R$ 37,9 milhões, e, cada Senador, a R$ 69,6 milhões.
As regras para alocação das emendas individuais aplicadas no exercício encerrado em 2023, também obedeceram à EC 126/2022, que foi aprovada em 21 de dezembro daquele ano. Assim, cada Deputado Federal teve direito a R$ 32,1 milhões, enquanto cada Senador teve direito a R$ 59,0 milhões.
Observe-se que o PLOA da União deve ser encaminhado pelo Presidente da República até 31 de agosto do ano anterior à vigência do orçamento anual. Dessa forma, parlamentares em fim de mandato no ano de 2022 puderam indicar emendas para execução em 2023, já fora de seus mandatos. De outro lado, parlamentares eleitos em 2022, mas que iniciaram a legislatura somente em 2023, não puderam indicar emendas individuais para execução naquele exercício.
Ressalte-se que, do montante das emendas individuais, pelo menos a metade deve ser destinada a ações e serviços públicos de saúde.
As emendas individuais impositivas ao orçamento, nos termos do art. 166-A, da Constituição Federal, são de duas espécies: i) transferência especial; e ii) transferência com finalidade definida.
As transferências especiais serão repassadas diretamente ao ente beneficiado (Estado, Distrito Federal ou Município), sem necessidade de convênio ou instrumento similar, os recursos financeiros pertencem ao ente no momento do seu recebimento, e serão aplicadas em programações finalísticas das áreas de competência do Poder Executivo local, devendo direcionar, no mínimo, 70% dos recursos em infraestrutura e, o restante, em custeio.
Nas transferências com finalidade definida, os recursos serão vinculados à programação estabelecida na emenda parlamentar, aplicados nas áreas de competência constitucional da União e, em regra, dependem de convênio.
Transferências para o Estado do Piauí
Em específico para o Estado do Piauí, em 2023, os dez Deputados receberam R$ 321,0 milhões e, os três Senadores, R$ 177,0 milhões, totalizando R$ 498,0 milhões. Lembrando que desse total, R$ 249,0 milhões devem ser carreados para ações de saúde (geralmente transferência fundo a fundo) e, a outra metade, para transferências especiais ou com finalidade definida.
Segundo dados disponibilizados no Painel Parlamentar do Sistema Transferegov.br, de acesso público, conforme análise empreendida em planilha extraída do mesmo sistema, evidenciou-se o desembolso (pagamento) de R$ 241,7 milhões em emendas, no período consultado.
Do montante desembolsado, foram pagos R$ 4,9 milhões em transferências com finalidade definida (2,0%) e, R$ 236,8 milhões em transferências especiais (98,0%).
O Governo do Estado do Piauí foi contemplado com R$ 26,8 milhões em transferências especiais, oriundos de emendas no valor de R$ 14,1 milhões da então Deputada Federal Rejane Dias, R$ 5,8 do Deputado Federal Merlong Solano, R$ 3,8 milhões do então Deputado Federal Fábio Abreu, R$ 2 milhões do Senador Marcelo Castro e, R$ 1,1 milhão do então Senador Elmano Ferrer.
Outros R$ 210,0 milhões liberados em transferências especiais foram destinados aos municípios. A análise considerou como corte montantes acima de R$ 1 milhão, destacando-se as seguintes evidências:
-> 57 municípios (25,4% dos 224 municípios piauienses) receberam 67,3% do total de transferências especiais (R$ 159,3 milhões);
-> o município de Buriti dos Lopes foi o maior contemplado, com R$ 11,08 milhões (19.654 habitantes), Caridade do Piauí com R$ 11,03 milhões (5.033 habitantes), e Pimenteiras, com R$ 9,88 milhões (11.341 habitantes).
-> em termos per capita, Floresta do Piauí (2.333 habitantes) foi contemplado com R$ 3.236,18, Caridade do Piauí (5.033 habitantes) com R$ 2.191,67, Cajazeira do Piauí (3.108 habitantes) com R$ 2.165,91, Barra d’Alcântara (3.995 habitantes) com R$ 1.639,97, e Teresina (868.075 habitantes), com R$ 2,02.
-> os parlamentares que mais transferiram valores em maior monta foram:
–> Elmano Ferrer (Senador): R$ 8,3 milhões para Buriti dos Lopes, R$ 8,3 milhões para Pimenteiras, R$ 3,0 milhões para Cajazeiras do Piauí;
–> Fábio Abreu (Deputado): R$ 4,3 milhões para Caridade do Piauí; R$ 2,0 milhões para Brejo do Piauí;
–> Marco Aurélio Sampaio (Deputado): R$ 4,0 milhões para Floresta do Piauí, R$ 3,2 milhões para Cajazeiras do Piauí, e R$ 4,0 milhões para Jacobina do Piauí;
–> Marina Santos (Deputada): R$ 6,4 milhões Barra d’Alcântara.
Do Controle Institucional e Social
O controle institucional das transferências com finalidade definida continua sob responsabilidade dos órgãos federais repassadores de recursos, ainda que tais recursos sejam originados de emendas individuais, obedecendo às regras inerentes às transferências voluntárias.
Quanto às transferências especiais, o Tribunal de Contas da União – TCU, mediante a Instrução Normativa – TCU 93/2024, regulamentou que cabe ao sistema de controle local, incluindo o respectivo tribunal de contas, a cuja jurisdição estiver vinculado o ente federado beneficiado com transferências especiais, no âmbito de suas competências e atribuições, a fiscalização sobre a regularidade das despesas efetuadas na aplicação de recursos recebidos, inclusive com a devida instauração do competente processo de tomada de contas especial, quando for o caso.
Nessa mesma norma, o TCU definiu que o ente federado beneficiado das transferências especiais deverá realizar a inserção de informações e documentos sobre a execução desses recursos na plataforma Transferegov.br, na forma e nos prazos estabelecidos na IN-TCU 93/2024 (36, 48 ou 60 meses, a depender do valor recebido), para fins de transparência e controle social, assim como para possibilitar a verificação do cumprimento das condicionantes estabelecidas na Constituição Federal quanto ao percentual mínimo de 70% em despesa de investimento.
A fiscalização do TCU sobre o cumprimento das condicionantes orçamentárias e financeiras que as legitimam, mencionadas acima, poderá ser realizada por meio de instrumentos de iniciativa própria ou de terceiros, como inspeções, auditorias, representações e denúncias, bem como a partir da análise de demonstrativos, relatórios, sistemas e demais fontes de dados e informações pertinentes, em especial mediante acompanhamento e análise de documentos e informações inseridos na plataforma Transferegov.br ou outra que a suceder.
Destaque-se que a Secretaria do Tesouro Nacional – STN estabeleceu a classificação das fontes ou destinações de recursos a ser utilizada por Estados, Distrito Federal e Municípios, nos termos da Portaria-STN 710/2021.
Dessa forma, o setor de contabilidade do ente público, ao receber recursos de transferências especiais, deve registrar na execução da transferência o código 706 – controle dos recursos transferidos provenientes de emendas individuais impositivas ao orçamento da União, para fins de evidenciação contábil, rastreamento dos recursos, prestação de contas e transparência.
Já o cidadão, principalmente se o município é de pequeno porte, pode acompanhar, mediante percepção, a aplicação dos recursos geridos pela municipalidade, contando com os canais de comunicação do controle institucional para esclarecimentos ou denúncias, a exemplo da Controladoria-Geral da União (CGU), tribunais de contas estaduais, ministério público ou TCU.
conclusão
Essas foram as conclusões da análise realizada sobre a evidenciação do direcionamento das emendas parlamentares individuais ao Estado do Piauí, em 2023, com destaque para as transferências especiais, que independem de convênios ou adimplência (nada consta) dos entes públicos beneficiários.
Essa análise pode ser replicada para qualquer outra Unidade da Federação do país, propiciando visão geral sobre a alocação das emendas parlamentares individuais.
Renato Santos Chaves
Mestre em Gestão Pública – UFPI
Auditor Federal de Controle Externo do TCU
Fontes:
- Portal Transferegov.br
- Comissão Mista de Planos, Orçamentos Públicos e Fiscalização (CMO)
- Constituição Federal de 1988
- Tribunal de Contas da União – TCU (IN-TCU 93/2024)
- Painel do Orçamento Federal – Ministério Planejamento e Orçamento
- Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE
- Secretaria do Tesouro Nacional – STN